Hipotenusas para carros e catetos para pedestres

Por que as autoridades dão sempre a pior opção para que vai a pé? Leia o bem-humorado artigo de Rodrigo Díaz, do blog chileno Ciudad Pedestre

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Fonte: Ciudad Pedestre  |  Autor: Rodrigo Díaz*  |  Postado em: 19 de julho de 2017

Placa de sinalização em Santiago, Chile

Placa de sinalização em Santiago, Chile

créditos: Imagen: Claudio Olivares @bicivilizate

A menor distância entre dois pontos é a mais bela, costumávamos dizer ao justificar tours arquitetônicos que muitas vezes se desviavam da linha reta. Numa linguagem geométrica, dois catetos bons são melhores do que uma má hipotenusa.

Tomar atalhos é uma prática tão antiga quanto caminhar. Natural para uma atividade particularmente lenta e que consome energia. Na prática, a maioria das pessoas não se dispõe a usar seus sapatos por mais de quinze minutos ou um quilômetro, o que ocorrer primeiro. Uma vez que esses limites sejam alcançados, o ser humano comum lança seus olhos para um veículo a motor.  

Numa perspectiva de promoção da mobilidade ativa (não-motorizada), se o mundo fosse reduzido a um triângulo, os pedestres deveriam ter a preferência de uso da hipotenusa, o caminho reto, mais curto entre dois pontos. 

O problema é que em zonas de intersecção, quando dois modos de mobilidade se cruzam, o gestor público  - que raramente caminha - opta pelo mais fácil, que é favorecer a viagem motorizada, mesmo que isso signifique desconforto e sacrifício para os elos mais fracos da cadeia de usuários de uma via, seja uma rua ou uma estrada.  

Embora mais e mais cidades em todo o mundo estejam tentando adaptar seus cruzamentos torná-los amigáveis aos pedestres, dando direito de passagem, encurtando distâncias e tempos de espera (ver o caso dos cruzamentos em diagonal, como o de Shibuya, em Tóquio, o mais movimentado do mundo) a mentalidade motorizada arraigada nos serviços públicos continua a desenhar os cruzamentos para aumentar a velocidade dos meios que já são os mais rápidos.  

Por causa de uma suposta sensação de eficiência dos meios motorizados, as autoridades continuam a desprezar a caminhada e tudo fazem para torná-la chata, difícil, complicada, quase impossível, embora seja a mais apropriada para distâncias curtas, embora funcione como um revigorante para a vida social e o comércio de rua. Além de tudo, tem emissões zero de carbono. 

Tudo o que escrevi aí acima é simplesmente para mostrar que seguir as instruções de travessia indicadas pela placa da foto não passa de uma boa merda, e poderá fazer com que o "senhor pedestre"  tenha que adicionar alguns metros inúteis à sua rota, além de aguardar a abertura de três demoradíssimos semáforos.  

Assim, não surpreende se o "senhor pedestre" fizer pouco caso da sinalização, e seguir o caminho lógico da linha reta, ainda que isso possa significar um certo risco, porque ali os motoristas se julgam em seu território. Mais tarde, quando recolherem seus restos mortais no pavimento, dirão que a culpa foi do "senhor pedestre". E que não se diga que ele não foi avisado. 

*Rodrigo Díaz é arquiteto e Mestre em Planejamento Urbano pelo MIT. Escreve sobre temas da mobilidade a pé no blog Ciudad Pedestre


Leia também:
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Mais tempo para o pedestre!
Artigo: Análise da mobilidade urbana para o pedestre

 


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