Por que o "pedestre distraído" é um mito

Nos EUA, um estudo mostra que, diferentemente do que se sugere, não é expressiva a parcela de pedestres que se distrai com o celular na hora de atravessar as ruas

Notícias
 

Fonte: Curbed/ Mobilize Brasil*  |  Autor: Alissa Walker  |  Postado em: 03 de julho de 2018

Com ou sem celular, pedestre não é tão distraído c

Com ou sem celular, pedestre não é tão distraído como se diz

créditos: Shutterstock

 

Nos últimos trinta anos, as mortes de pedestres aumentaram nos EUA, o que levou algumas cidades a organizarem campanhas para alertar a população a deixar seus celulares no bolso enquanto caminha, e prestar mais atenção ao trânsito. Agora, novas e consistentes pesquisas revelaram que os pedestres provavelmente não estão "mandando mensagens para a morte" como se diz, ou, não estão tão distraídos assim ao cruzar as vias.

 

Embora o termo "andar distraído" tenha se tornado um jeito de responsabilizar as pessoas a pé por supostamente ficarem olhando para seus aparelhos em vez de atentarem aos limites da calçada, não há evidências que provem que os usuários de smartphones têm uma culpa maior na ocorrência dos atropelamentos. Na verdade, a maioria dos estados americanos nem inclui o comportamento dos pedestres como um fator relevante nos relatórios de erros no trânsito.

 

Essa foi a constatação de um novo estudo publicado por um grupo de professores de engenharia da Northern Arizona University, que examinou as maneiras como 3.038 pessoas usavam as faixas de pedestres nas cidades de Nova York e Flagstaff (Arizona). A conclusão é que a grande maioria dos pedestres - 86,5% - não exibia o tal “comportamento distraído". Mesmo entre os que usavam celular não se verificou uma tendência maior a não obedecer ao sinal fechado.

 

Além disso, a maioria dos pedestres, distraídos ou não, não cometeu violações que possam tornar uma colisão mais provável. Apenas 16% de todos os caminhantes cruzaram fora da faixa de pedestres, e 23% o fizeram na ausência de um sinal de "Atravesse", ou enquanto o "Não Ande" estava aceso ou piscando em contagem regressiva (situações que, em algumas cidades dos EUA, podem render multas às pessoas).

 

Em relação ao perfil dos avaliados, no quesito gênero os homens se mostraram mais propensos a cometer violações durante a caminhada do que as mulheres. Já as pessoas que usavam celulares eram ligeiramente mais propensas a passar fora da faixa de pedestres, mas mesmo assim não tiveram uma probabilidade maior de passar o sinal fechado.

 

Em números totais, dos mais de 3 mil pedestres observados no estudo, a grande maioria não se distraiu ao usar as faixas de pedestres.

 

Motoristas

Embora o estudo não tenha analisado, nos mesmos cruzamentos, o comportamento de motoristas, há citação de pesquisas mostrando o quanto as "distrações" ao volante contribuíram para interferir na condução do veículos nas ruas. 

 

Um estudo do Centro de Controle e Prevenção de Doenças, ligado ao Departamento de Saúde dos Estados Unidos, observou que 31% dos motoristas americanos reconheceram ter mandado mensagens de texto por celular enquanto dirigiam nos últimos trinta dias (número que pode estar subestimado, já que baseado no relato do próprio motorista). 

 

Além disso, vários outros estudos recentes vêm mostrando o quanto o uso do celular enquanto dirige pode retardar o tempo de reação do condutor. Esse comportamento, conforme vem sendo observado, pode ser tão perigoso quanto dirigir embriagado.

 

Pedestres

O estudo da Universidade do Arizona é especialmente oportuno, já que cada vez mais cidades vêm criminalizando alguns comportamentos do pedestre ao atravessar as ruas. Autoridades de Honolulu (Havaí), por exemplo, foram além das campanhas de conscientização e agora estão multando os transeuntes em até 99 dólares por simplesmente olharem para seus aparelhos nas faixas de pedestres.

 

Estes resultados são sugestivos de que não é papel do município adotar medidas para lembrar as pessoas de prestarem mais atenção nas suas caminhadas. E que o mais acertado para evitar acidentes -  mesmo aos 14% mais distraídos - são soluções de engenharia que tornem as faixas de pedestres mais seguras para todos. Ações como evitar que os motoristas virem à direita nos sinais vermelhos, por exemplo, são práticas políticas mais eficazes.

 

Soluções

Uma ideia simples que pode trazer mais segurança na via é programar as luzes dos semáforos para dar ao pedestre alguns segundos de antecedência antes de mudar para o vermelho. Em cruzamentos com alto volume de tráfego, uma faixa de pedestres que pare todos os veículos ao mesmo tempo, de todos os lados, permitindo aos pedestres atravessarem em qualquer direção, é outra maneira inteligente de separar o movimento de carros e pessoas.

 

Outro benefício das políticas que priorizam os caminhantes sobre os carros é contribuir para que mais pessoas andem. O engenheiro David Levinson, em artigo no blog Transportist, revela como os sinais de trânsito favorecem os veículos sobre os pedestres, prolongando ainda mais o tempo de caminhada das pessoas. Os pedestres muitas vezes precisam dar alguns passos desviando do seu caminho até ingressar numa faixa de pedestres; ou pressionar um botão e implorar para que o sinal abra, o que representa um gasto de até 20% de seu tempo de viagem esperando pela passagem dos carros.

 

*Traduzido e adaptado por Regina Rocha/ Mobilize Brasil 

 

Leia também:
Placas deixadas em rua do Recife pedem respeito ao pedestre
Como os sinais de trânsito priorizam os carros e desencorajam o caminhar
Pedestres bloqueados e em grande risco na W3 Sul – Brasilia Para Pessoas
Multa para pedestres e ciclistas é adiada para 2019
Após décadas, as ruas dos EUA voltam a ficar mais perigosas aos pedestres

 


  • Compartilhe:
  • Share on Google+

Comentários

Nenhum comentário até o momento. Seja o primeiro!!!

Clique aqui e deixe seu comentário