Sincronizar semáforos: solução para os congestionamentos?

Governo de Florianópolis quer melhorar o trânsito com novo sistema semafórico nos cruzamentos da Ilha. Melhor seria priorizar o transporte público, diz professor da UFSC

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Fonte: Diário Catarinense  |  Autor: Karollayne Rosa  |  Postado em: 06 de setembro de 2018

Sincronia dos sinais não vai resolver, diz profess

Sincronia dos sinais não vai resolver, diz professor da UFSC

créditos: Trânsito 24h

Até janeiro de 2019, a Prefeitura de Florianópolis prevê concluir a sincronização dos semáforos nos principais cruzamentos do centro da Ilha. O novo sistema semafórico será instalado em 30 sinaleiros das avenidas Beira-Mar Norte, Rio Branco, Paulo Fontes e Mauro Ramos. Segundo Rubens Cardiga, da diretoria de operações da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano, o objetivo é agir sobre as vias que atualmente apresentam mais congestionamentos.

Mas, por mais que o novo sistema seja útil em alguns locais, ele não irá resolver o problema de congestionamento na capital, afirma o pesquisador do Observatório da Mobilidade e professor do curso de Engenharia de Automação da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) Werner Kraus Junior. Para o pesquisador, o problema do trânsito está no volume de veículos, que é maior do que as ruas conseguem suportar. 

Ele acredita que a sincronia dos semáforos poderá ser útil nos cruzamentos onde não há muito congestionamento, mas ressalta que a questão da mobilidade precisa ser pensada de maneira mais ampla pelo poder público. "A solução para Florianópolis, assim como para o mundo todo, é investir em transporte coletivo", defende.

Um ponto problemático do novo sistema semafórico, identificado pelo pesquisador da UFSC, é a falta de prioridade para os veículos do transporte coletivo. Segundo Kraus, não há um recurso que permita identificar a presença do ônibus e que faça o sinal abrir mais rápido para esse tipo de veículo, o que contribuiria para melhorar a mobilidade do transporte de massa. E acrescenta que o sistema não oferece essa possibilidade porque a cidade ainda não tem faixas exclusivas para ônibus, e nem há previsão de que venha a ter.

Para o pesquisador, outra medida que ajudaria a descongestionar as vias e melhor a mobilidade seriam investimentos no sistema cicloviário da cidade, estratégicos para a redução dos veículos automotores. "Tão importante quanto conectar as ciclovias e ciclofaixas é investir em rotas cicláveis, que nada mais são do que vias compartilhadas com os ciclistas, outro ponto fundamental para uma mobilidade eficiente", defende.

A condição de não priorização do transporte público não difere muito em todo o estado. Na sua opinião, os melhores exemplos para a Grande Florianópolis vêm de Criciúma, Blumenau e Joinville, cidades que implantaram faixas exclusivas para transporte coletivo, permitindo que os ônibus avancem por estarem na frente da fila, ainda que os semáforos estejam regulados conforme o tráfico geral de veículos. "Blumenau e Joinville são interessantes, pois são cidades com pouco espaço viário e, mesmo assim, optaram por destinar uma faixa para o ônibus. Fizeram a correta priorização para o transporte coletivo", avalia.

Um só sistema

Nas maiores cidades de Santa Catarina, as regiões com alta concentração de serviços e chegadas de rodovias são os pontos mais críticos em relação à falta de mobilidade. Para Kraus, por isso o sistema de transporte coletivo das cidades metropolitanas precisa ser pensado como um só sistema. "O transporte coletivo intermunicipal da Grande Florianópolis tem caráter urbano. De Biguaçu até Palhoça, de São José a Florianópolis, é uma só cidade,  uma só conurbação. As rodovias que fazem a interligação desses territórios têm maior capacidade de transporte e é onde a gente gostaria de ver aplicadas as soluções de velocidade e alta capacidade para o transporte público".

Mas 90% da capacidade da Ponte Pedro Ivo, que liga a Ilha à região metropolitana, é ocupada por carros e motocicletas, que transportam diariamente 11 mil pessoas segundo o Plamus. E os ônibus, apesar de conduzirem quase a mesma quantidade, cerca de 10 mil cidadãos, ocupam apenas 1% da capacidade da ponte e representam apenas 3% dos veículos que transitam diariamente no local, explica o pesquisador.

Especulação imobiliária

Ao contrário do que acontece nas cidades metropolitanas, a Ilha concentra 20% mais empregos em comparação à quantidade de moradores que trabalham, conforme o Plano de Mobilidade Urbana Sustentável de Florianópolis (Plamus), de 2015. 

"Para falar de mobilidade, antes precisamos pensar como está a distribuição da população pelo território da cidade. Na questão informal da expansão urbana, há a segregação dos trabalhadores nas periferias que precisam se deslocar aos centros urbanos", ressalta Kraus.

Segundo ele, a especulação imobiliária força esse espalhamento por causa dos altos preços dos imóveis nas regiões centrais. "A especulação imobiliária acaba distorcendo as possibilidades de moradia, levando as populações que mais necessitam de transporte, que são os trabalhadores, para a periferia, encarecendo as soluções de transporte", destaca.

Todos os dias, aproximadamente 138 mil pessoas atravessam a ponte para trabalhar ou estudar. O número corresponde a 85% das viagens à Ilha, sendo que dessas 50% são feitas por meio de transporte individual. Em termos de veículos, são 172 mil diariamente e, no horário de pico da tarde, passam pela ponte 7,6 mil a cada hora. A Grande Florianópolis reúne 48% de veículos particulares, número acima da média nacional, que é de 32% segundo levantamento feito pelo Plamus.

Questão de direito

Desde 2015, o transporte é considerado um direito constitucional. "Cidades pelo mundo afora tem transporte de qualidade porque tem investimento. A sociedade até consagrou na sua Constituição esse direito, então nós temos que ter essa consciência", desabafa. Segundo ele, todas as cidades referência em mobilidade urbana têm comunidades que aceitam subsídios públicos expressivos e financiam órgãos de planejamento e fiscalização dos sistemas de mobilidade. 

"Não tem saída, vai ter que ser pela via pública. A sociedade precisa entender que, assim como ela paga calçada, rua, asfalto, ela tem que subsidiar também a infraestrutura do transporte público e tem que apoiar a construção de institutos de planejamento consistentes, sólidos e permanentes, responsáveis por regrar também o uso e ocupação do solo. Não tem outra fórmula para a solução do problema do transporte. Se quiser repetir experiências bem sucedidas lá de fora, a sociedade tem que se conscientizar de que é preciso pagar por esse transporte coletivo, se não a cidade não vai funcionar", finaliza.

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