"Salvador não tem boa performance na mobilidade ativa"

Esta a conclusão da avaliadora da Campanha Calçadas do Brasil, que observou calçadas estreitas, sem faixa livre e obstruídas por barracas e postes nos bairros da cidade

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Fonte: Mobilize Brasil  |  Autor: Regina Rocha/ Mobilize Brasil  |  Postado em: 12 de junho de 2019

Na calçada do hospital, dois pedestres só passam a

Na calçada do hospital, dois pedestres só passam apertado

créditos: Arquivo pessoal

 

Durante um mês e meio, um grupo de quatro estudantes universitários percorreu várias ruas da cidade de Salvador, selecionadas a partir das três áreas em que se divide o território urbano (orla, miolo e subúrbio), para realizar avaliações de caminhabilidade da Campanha Calçadas do Brasil 2019. Foram visitados especificamente passeios ao longo do entorno de equipamentos públicos, como hospitais, escolas, parques, tribunais, bibliotecas etc., já que este é o mote da atual campanha. 

 

Além de Isabella Illana Ferreira Lopes*, aluna de Urbanismo na Universidade do Estado da Bahia (Uneb), o grupo de avaliadores contou com os futuros arquitetos Evelyn (Unifacs) e Ítalo (UFBA), e o engenheiro Kaíc, que realiza mestrado em Arquitetura e Urbanismo na Universidade Federal da Bahia (UFBA)**.

 

Após fazer a experiência in loco por quilômetros de calçadas na cidade, a conclusão da jovem equipe é que as administrações vêm tratando com evidente desigualdade o ambiente urbano, a depender da área em que se encontra o equipamento instalado. Ou, nas palavras de Illana: "Em calçadas dos bairros mais 'nobres' da capital, nota-se maior investimento na qualidade infraestrutural e no cuidado do poder público; já nos bairros 'periféricos', a população tem que enfrentar, nos seus deslocamentos diários, a total falta de acessibilidade".

 

Isabella Illana Ferreira Lopes. Foto: Arquivo pessoal 

 

Leia a seguir a entrevista em que Illana dá mais detalhes da situação preocupante da mobilidade para o pedestre na capital baiana:

 

Como está a cidade de Salvador para a pessoa que caminha ou circula em cadeira de rodas, por exemplo?

De modo geral, as calçadas são estreitas, sem pavimentação, sem piso tátil ou rampas de acessibilidade. Fica evidente que uma pessoa, principalmente se tiver mobilidade reduzida, terá imensa dificuldade de circulação pela cidade. 

 

Há algum plano ou programa para melhoria de calçadas, sinalização e equipamentos de apoio à mobilidade a pé?

Bem, só me ocorre o Plano de Mobilidade Urbana de Salvador (PlanMob). Lá estão incluídas, com esta nomenclatura, a previsão de "intervenções em sistemas e dispositivos de transporte facilitadores de microacessibilidade vertical (escadarias, escadas rolantes, planos inclinados, elevadores), além de sistemas teleféricos para acessibilidade entre cumeadas."

 

Como vocês escolheram os locais a serem avaliados na Campanha Calçadas do Brasil?

Selecionamos uma amostra de bairros compreendidos na divisão da cidade de Salvador feita pela Associação de Empresas de Transporte de Salvador (Integra), que, para fins operacionais, separa o território em: Orla, Miolo e Subúrbio. Nessa amostra, nossa seleção buscou incluir bairros com moradores de poder aquisitivo variado. 

 

Quantas pessoas participaram e em quanto tempo foram feitas as avaliações?

As avaliações em Salvador duraram um mês e meio, e foram feitas por um grupo de quatro pessoas. Além de mim, Isabella, que estudo Urbanismo na Universidade do Estado da Bahia (Uneb), participaram os estudantes de arquitetura e urbanismo Evelyn (Unifacs) e Ítalo (UFBA), e Kaíc, que é mestre em engenharia de transportes e gestão territorial pela UFSC e está terminando outro mestrado em Arquitetura e Urbanismo na Universidade Federal da Bahia**.

 

No trabalho de campo, em que medida os critérios adotados nos formulários da Campanha se adequaram à sua cidade? 

Primeiro dizer que Salvador não desempenha boa performance na mobilidade ativa (caminhabilidade). Por isso, em grande parte dos casos a cidade não cumpriu, ou obteve má pontuação, nos critérios de qualidade adotados pela ação do Mobilize Brasil. Por exemplo, nos bairros periféricos boa parte das calçadas obteve notas baixas nos itens largura total e largura da faixa livre, pois lá os passeios são estreitos, praticamente sem faixa livre. Isso faz com que os pedestres, impedidos de seguir por obstáculos que encontram pelo caminho, como barracas de ambulantes ou postes e outros elementos do mobiliário urbano, tenham que passar pela rua, disputando espaço com os carros.

 

No bairro de São Cristóvão, em Salvador, obstáculos pelo caminho e piso mal conservado. Foto: Arquivo pessoal

 

Você fala de calçadas estreitas, sem faixa livre, com obstáculos. Pode citar alguns locais onde essa situação é mais grave?

No bairro onde eu moro, São Cristóvão, a situação é bem grave, por exemplo. As calçadas lá são largas, porém ocupadas por barracas, o que dificulta a circulação de pedestres. Nessa região avaliamos o Colégio Estadual Visconde de Mauá, mas posso dizer que a situação se repete por toda a avenida Aliomar Baleeiro. Outro exemplo crítico é na rua Santa Bárbara do Saboeiro, no bairro do Cabula, onde fica o Hospital Roberto Santos. Ali as calçadas não têm obstáculos, mas em compensação medem menos de um metro, o que também atrapalha e muito a passagem dos pedestres. Pelas calçadas desse hospital é possível passar, por vez, apenas duas pessoas (e de biotipo magro); e, no lado oposto da rua, as calçadas não são nem pavimentadas! Quer dizer, o pavimento é apenas grama; isso se estende por quase todo o percurso e influencia negativamente em especial a movimentação de pessoas com mobilidade reduzida. 

 

Grama ocupa o lugar do pavimento na calçada do Hospital Roberto Santos. Foto: Arquivo pessoal

 

Pelo resultado final das avaliações, o que dizer do cuidado público com as calçadas? Que solução urbanística poderia melhorar a caminhabilidade nessas áreas?

O que percebemos é que as calçadas situadas nos bairros mais “nobres” da capital recebem maior investimento de qualidade infraestrutural e um cuidado diferenciado por parte do poder público. Já nos bairros “periféricos”, a população tem que enfrentar a falta de acessibilidade nos seus deslocamentos diários.

Em nossa avaliação, sentimos que será preciso haver um estudo técnico, com diagnóstico preciso, para que sejam identificadas as necessidades de caminhabilidade dos moradores desses bairros mais afastados, uma vez que são eles os que mais fazem percursos a pé, até por não terem seu veículo particular. Então, independente do tipo de equipamento público, a qualidade das calçadas vistoriadas variou segundo o perfil econômico dos moradores de cada região. Um exemplo de calçadas bem tratadas são as bem mais largas e pavimentadas do Farol de Itapuã; e as calçadas da Arena Aquática de Salvador, na av. Octávio Mangabeira, no bairro da Pituba.

 

Calçada regular e bem conservada em área "nobre" perto do Farol de Itapoã. Foto: Arquivo pessoal



A realidade na periferia é bem outra: carro estacionado na calçada, bancas e outros obstáculos em São Cristóvão.
Foto: Arquivo pessoal  

 

*Isabella Illana Ferreira Lopes é aluna do 8° semestre do curso de Urbanismo pela Universidade do Estado da Bahia (Uneb), e faz estágio da Secretaria de Desenvolvimento Urbano (Sedur).

** Ítalo Santana Santos cursa o 7° semestre de Arquitetura e Urbanismo na Universidade Federal da Bahia (UFBA); Evelyn Marchant faz o 8° semestre em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Salvador (Unifacs); e Kaíc Lopes é mestre em Engenharia de Transportes e Gestão Territorial pela UFSC e está terminando outro mestrado em Arquitetura e Urbanismo na UFBA.

 

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