Não se resolve mobilidade com mobilidade

Três horas. Essa é a média de tempo que os paulistanos que se locomovem de carro permanecem dentro de seus automóveis todos os dias*

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 |  Autor: Natália Garcia, do blog Cidades para as Pessoas  |  Postado em: 21 de dezembro de 2011

Quadrinho sobre o trânsito caótico

Quadrinho sobre o trânsito caótico

créditos: KIRK

*segundo a última pesquisa Origem Destino, realizada pelo metrô em 2007.

 

O trânsito da cidade é um dos primeiros assuntos que se discutem no elevador do trabalho ao na chegada ao boteco no fim do dia.

Teorias e mais teorias lançadas nessas conversas informais: “a gente precisa de mais avenidas”, “tem que fazer mais túneis, viadutos”, “não não, é preciso investir em transporte público”, “precisamos é de mais ciclovias”….

 

Acontece que essas teorias são furadas. Sabe por que? Porque a solução para a mobilidade urbana não é a mobilidade urbana.

Tentar resolver o trânsito viabilizando mais formas de transitar é como o cachorro que corre atrás do próprio rabo: não adianta.

 

“Antes de mais nada é preciso entender que as cidades são organismos multidisciplinares”, me disse o planejador urbano dinamarquês Jeff Risom, do Gehl Architects. Não dá para dissociar a mobilidade urbana de questões como habitação, oportunidades de emprego e gestão de rios. Todos esses ítens estão interligados e uma solução para o problema do trânsito que não leve tudo isso em conta não vai, a rigor, resolver nada.

 

Como é que faz, então?

 

Há um plano sendo desenvolvido para São Paulo chamado SP 2040, uma espécie de guia para tentar nortear o crescimento da cidade de forma mais sustentável e estratégica.

O plano é dividido em cinco eixos: oportunidades de negócios, desenvolvimento urbano, mobilidade e acessibilidade, coesão social e melhoria ambiental. Todos esses eixos formam, juntos, um plano de diretrizes e metas que vão nortear o crescimento da cidade até o ano de 2040.

 

Um dos consultores do eixo mobilidade e acessibilidade é o engenheiro Mário Garcia. Segundo ele, um dos primeiros passos para melhorar o trânsito de São Paulo é diminuir a necessidade de deslocamentos pela cidade. Isso pode acontecer com ferramentas que garantam, a partir de incentivos financeiros, que as pessoas morem perto de onde trabalham ou da escola dos filhos, por exemplo.

Segundo Garcia, há uma histórica concentração dos empregos de São Paulo nas regiões do centro expandido da cidade e de habitantes nas periferias paulistas. “Melhorar o trânsito significa mudar essa lógica”, diz o engenheiro. Em vez de possuir um grande núcleo de empregos e serviços, a cidade precisaria ser uma série de núcleos menores e com um certo grau de auto suficiência para que não fosse necessário se locomover por distâncias tão grandes todos os dias.

 

Outro ponto é que o modelo de desenvolvimento do transporte público é ineficiente estrategicamente.

Imagine que a prefeitura de São Paulo identifica uma rua na periferia que seria beneficiada com um corredor de ônibus, por exemplo. Assim que a secretaria de transportes decide construir o corredor, qual a primeira coisa que acontece com as casas do entorno? Valorizam, sobem de preço. Daí, as pessoas que se beneficiariam dessa nova rede de transporte acabam não conseguindo permanecer em suas casas, são obrigadas a se mudarem para outra região e criam uma nova demanda por transporte público. “Fica muito difícil resolver o problema de se transportar na cidade sem pensar na questão da habitação”, sintetiza Garcia, que é a favor de um certo controle sobre a valorização imobiliária advinda do progresso público com novas redes de transporte público. “Uma tributação sobre essa valorização imobiliária que acontece com novos transporte públicos poderia ser revertida em incentivos para que as pessoas morem perto de onde trabalham”, teoriza.

 

Na prática é o oposto do que vemos na recente estação da linha amarela Faria Lima, que revolucionou a região do Largo da Batata em São Paulo. Passando por ali há alguns dias eu vi quarteirões inteiros derrubados para darem lugar a grandes empreendimentos imobiliários.

Todos os moradores de todas aquelas casinhas tiveram que se mudar para outro lugar e criaram uma nova demanda por transporte público. E, certamente, continuam chegando ao trabalho e reclamando do trânsito no elevador.


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