23 de Maio para as Pessoas. É possível? – Instituto Caminhabilidade
Instituto Caminhabilidade

13
fevereiro
Publicado por leticia no dia 13 de fevereiro de 2018

Reflexões sobre a 23 de Maio como via lenta

 

Folia na 23 de Maio

Durante o Carnaval de 2018, com muitas criticas, não pelo bloqueio da via mas sim por descaracterizar blocos e ao se transladar para grandes avenidas, alguns blocos patrocinados pela Skol com expectativa de grande público foram alocados na Avenida 23 de Maio.

 

Imagem própria — 11/02/2018

Desde o início deste anuncio eu vi isso como uma grande oportunidade, tanto de refletir sobre esta via expressa não ser tão importante para os deslocamentos na cidade, pois ela rasga a cidade oferecendo um acesso sem paradas e semáforos, mas existe acesso a todos os locais por ruas menores da cidade — além de o metro de alguma forma fazer também este trajeto — quanto de fazer varias pessoas viverem a ressignificação do espaço, ao estar lá pulando e dançando em segurança, onde normalmente não conseguimos nem mesmo caminhar nas calçadas.

 

 

E os efeito desta experimentação pelos foliões foi de alegria e perplexidade por estar foliando por aquele espaço originalmente rápido e congestionado. Como é possível ver nesta matéria da Globo que mostra o carnaval na via no domingo e usa frases como “congestionada de alegria” e “foi uma 23 sem buzinas e pneus, só com folia e pés que saíram do chão sem parar” para descrever como foi a ocupação carnavalesca da 23 de maio.

 

Mas os efeitos vão muito além da folia.

 

Você já tentou caminhar alguma vez na 23 de Maio?

 

Em duas ocasiões fizemos eventos do SampaPé! na avenida.

 

A primeira ocasião foi em março de 2015, quando fizemos um passeio na 23 para ver os graffitis recém pintado, como forma também de contestação: “De que adianta ter o maior corredor de graffitis da América Latina se a via só é acessada por automóveis a 50–60km/h?”. E lá fomos nós caminhar na calçada na 23 observando os graffitis.

 

Foto por Ben & Jerry’s — album completo

A segunda, foi quase dois anos depois, em Janeiro de 2017, quando no início da gestão Dória começou uma ação municipal para apagar os graffitis da 23. Então, organizamos uma caminhada protesto e mapeamento para a gente manter essa memória da cidade, mostrar nossa indignação com tal atitude e chamar atenção.

 

 

(Há dois vídeos que mostram esta experiência, um da Página da Rachel e outro do Canal Mova-se)

 

Ambas experiências causaram bastante estranhamento dos motoristas e um experiência inesquecível aos caminhantes por circular por um espaço que normalmente nos é negado.

 

23 de Maio em dia comum — Imagem R7

 

Mas nada se compara a cena deste carnaval: surreal e hipnotizante.

 

De repente, 10 pistas de asfalto normalmente tomadas pela velocidade e pelo ruído estavam tomadas por gente, vendedores de pipoca, crianças, vozes e até o canto dos pássaros- sim, eles existem por lá.

 

Zona 5km/h

VIDEO: Passarinhos e pessoas na 23 de maio

 

A criação da 23 de Maio

 

A 23 de Maio é parte de uma via expressa que rasga São Paulo de norte a sul do centro expandido da cidade, inaugurada oficialmente como tal em 1969 cortando diversos bairros para garantir a conexão rápida por automóvel, principalmente do centro ao aeroporto de congonhas.

 

Foto no Pinterest da 23 de Maio em construção.

 

Seu início foi em 1927 com a criação da Avenida Itororó, que margeava o riacho Itororó, e seguia a teoria dos “fundos de vale” como lugares para avenidas. Mas realmente como via expressa ela foi planejada em 1937 pelo Prestes Maia em seu plano de avenidas, e executada apenas muito depois, até mesmo porque exigia-se muitas desapropriações para a sua construção.

 

Foto no Pinterest da canalização do riacho Itororó.

 

Desde então ela sofreu alargamentos, ganhou faixa exclusiva de ônibus, teve mudança nas velocidades e polêmicas do seus muros, e os viadutos que foram construídos pensando em se tornar estações de metrô nunca cumpriram esta função. E ela e uma estrada no vale no meio da cidade, que normalmente está cheia de carros.

 

Ressignificação da 23 de Maio para as Pessoas?

 

Desde o início de 2018, após chegar em São Paulo depois de 1 ano e meio morando em Londres fazendo mestrado em Planejamento e Design Urbano, quando pegava ônibus em São Paulo, que normalmente vão por grandes avenidas que cortam a cidade, como a 9 de Julho, Rebouças e a 23 de Maio, eu chorava pensando como deixamos a cidade se desenvolver neste modelo de eficiência e desumanização e se haveria algo que fosse possível fazer para reverter isso.

 

 

Em um destes roteiros no ônibus pensei que se ao menos conseguisse começar um debate para a desativação da 23 de maio como via expressa e pensar possíveis alternativas para sua reinserção na vida urbana, talvez com construção de novas quadras e moradia social em zonas centrais, ou talvez como um grande parque natural no meio da cidade, com acesso por diversos bairros, entre outras possibilidades, isso representaria uma possível mudança.

 

O meu envolvimento e reflexão sobre a 23 de maio na cidade e seus efeitos não era tão recente, antes mesmo de eu haver estudado urbanismo, esta questão apareceu no início do SampaPé!, em 2012, ao estudar e pesquisar 2 roteiros de passeios: Bixiga e Liberdade. Ambos roteiros são em bairros altamente afetados em sua forma e história pela passagem da avenida 23 de maio.

 

No Bixiga, um dos lugares mais emblemáticos: a Vila Itororó, teve a primeira piscina privada da cidade e esta era de água natural que vinha do riacho Itororó, agora canalizado embaixo da 23.

 

Vila Itororó durante Passeio do SampaPé! no Bixiga em 2012
Enquanto na Liberdade, o complexo de vias expressas que fazem seu nó por ali, destruiu o cemitério que ficava no local, primeiro cemitério público e popular da cidade, restando apenas a pequena Igreja Nossa Senhora dos Aflitos, que por estar “incrustada” na rua chama muita atenção.
Igreja Nossa Senhora dos Aflitos durante Passeio do SampaPé! na Liberdade em 2013

 

 

Outro sonhador de uma transformação urbana radical é o Delijaicov, professor da FAU USP e grande defensor da recuperação dos rios da cidade para uso, propondo um anel hidroviário, inspirado nas grande capitais européias. Onde o riacho Itororó seria transformado em um canal se conectando com o Saracura na 9 de Julho.

 

Imagem criada por Fujocka para matéria na Revista Trip

 

Experimentando a 23 de maio com os pés

 

Mas mais importante do que nós, urbanistas e ativistas, pensamos e queremos para a cidade é experimentar mudanças e ver como as pessoas vivem estas oportunidades.

 

Como haveriam blocos por lá no domingo, segunda e terça, a via acabou ficando bloqueada para motores ininterruptamente em uma grande extensão.

 

 

As pessoas que moram no entorno que a princípio foram lá de curiosas, ver como era, começaram a se apropriar da via pouco a pouco fora do horário dos blocos.

Observando a 23

Observando a 23

De bike com os amigos

De bike com os amigos

 

Tinha gente correndo, andando de bicicleta, passeando com os cachorros, colhendo goiaba, passeando com o carrinho, comendo e jogando bola. Aproveitando este espaço e sentindo esta perspectiva e experiência nunca sentida antes, como um espaço para parar e estar.

Correndo

Correndo

Levando os cachorros para passear

Levando os cachorros para passear

Eu (Leticia) sentada na 23

Eu (Leticia) sentada na 23

 

 

O primeiro passo já foi dado, a 23 como espaço para eventos musicais. E você como imagina que a 23 de maio possa ser ressignificada? Qual é o futuro da 23 de maio?

 

Ficou com vontade de experimentar a 23 de maio assim? Ainda dá, no próximo sábado dia 17 de fevereiro tem bloco de novo, e a via bloqueia as 6h da manhã, muito antes da chegada dos foliões e da música, e a gente vai se reunir para fazer uma caminhada conversando sobre urbanismo e vias com início às 10h no metrô Paraíso – evento aqui.

 



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