O fim nada sustentável das bicicletas amarelas

Análise sobre o fim da Grow discute como a ânsia de escalar uma startup de alto investimento não se mostrou compatível com as possibilidades reais e o tamanho do mercado

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Fonte: O Estado de S. Paulo  |  Autor: Davi Bertoncello*  |  Postado em: 31 de março de 2020

Bikes amarelas foram retiradas das ruas em 2020

Bikes amarelas foram retiradas das ruas em 2020

créditos: Reprodução

Quando pelas ruas de São Paulo começaram a surgir bicicletas de todas as cores, algo mudou além da paisagem da cidade. Diferentes iniciativas, que ao longo dos últimos anos têm incentivado o uso de bicicletas, alteraram definitivamente a forma como pensamos mobilidade.

 

Um meio de locomoção perfeito para a atualidade, a bicicleta não é algo novo. A inovação foram os serviços pelos quais podemos alugar de forma simples, rápida e acessível uma bicicleta ou um patinete. Solução para resolver a dor da última milha; basta sair do metrô, alugar e pedalar até o destino.

 

Parece óbvio, mas por que não foi feito antes?

Quando o Provos, grupo da contracultura holandesa dos anos 1960, deixou bicicletas brancas pela cidade para uso gratuito, elas foram recolhidas em razão de uma lei que obrigava ao uso de cadeados.

 

Na China, conhecida como o “Reino da Bicicleta”, sempre foi um dos principais meios de transporte até que, entre 1995 e 2002, o governo fez campanha para a sua redução em prol de outros meios. E voltou a ser incentivada após o surto de sars, em 2002, como forma de evitar a transmissão comunitária da epidemia pelo uso de transporte público.

 

Em 2014, surgiu então a primeira startup de compartilhamento de bicicletas na China e depois diversas outras mundo afora, até a invasão da Faria Lima (em SP). 

 

Possibilidade de lucro

O que mudou desde as bicicletas brancas até as centenas de milhares de dólares investidos nesse negócio foi a possibilidade de tornar uma solução sustentável, saudável e compartilhada em algo lucrativo.

 

Acontece que, antes mesmo desse negócio se provar lucrativo, já havia dezenas de empresas levando a solução a diferentes regiões, em uma corrida pelo protagonismo do mercado de compartilhamento de bicicletas.

 

Agora, com diversas delas fechando – como o caso das bicicletas amarelas – ou reduzindo radicalmente suas estruturas, veio na esteira a diminuição recente do apetite dos investidores por negócios similares, mesmo com alguns casos de sucesso como a Tembici e suas bikes laranja.

 

O desafio da última milha é parte importante do problema da mobilidade, mas como oportunidade de negócio tem-se mostrado menos atrativo que a expectativa. Provavelmente, o tamanho do mercado foi superdimensionado. 

 

Resta saber se, neste cenário, com diversas empresas tirando bicicletas de circulação, os valores da sustentabilidade e o compartilhamento pregados serão mantidos.

 

Plano de descarte

Um caso de desfecho sombrio é o que tem ocorrido com as bicicletas da Grow. Tiradas de circulação, foram doadas a catadores de materiais recicláveis por meio da ONG Pimp My Carroça. O problema é que, embora customizadas para não aludir às empresas e com certificados de doação, têm sido apreendidas pela GCM e pela PM de São Paulo.

 

Mais que nunca, é importante que empreendedores e investidores, beneficiados por identificar seus negócios com a pauta da sustentabilidade, apliquem esses valores inclusive em circunstâncias adversas.

 

Uma das formas de avaliar o impacto ambiental de um produto é realizar sua Análise de Ciclo de Vida (ACV), desde a extração da matéria-prima até seu descarte ou reciclagem. Essa análise é também chamada de “avaliação do berço ao túmulo”. Fica a lição a quem mais quiser entrar nessa: do pó viemos e ao pó voltaremos, mas, para todo o resto, é necessário um plano de descarte.

 

*Davi Bertoncello é CEO da startup de mobilidade urbana Tupinambá. Artigo editado pelo Mobilize. Título original: "A morte nada sustentável das bicicletas amarelas"

 

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