A bicicleta como meio; a melhoria da cidade como fim

Para a ativista Aline Cavalcante (oGangorra, Bike é Legal, Vá de Bike) 400 km de ciclovias em SP são uma conquista importante, mas ainda há muito o que fazer pela cidade

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Fonte: Mobilize Brasil  |  Autor: Du Dias / Mobilize Brasil  |  Postado em: 28 de agosto de 2014

A jornalista e ativista Aline Cavalcante

A jornalista e ativista Aline Cavalcante

créditos: Reprodução

 

Após a prefeitura de São Paulo divulgar o plano cicloviário para o município e começar a implantar parte dos 400 km de vias cicláveis previstos no documento, a bicicleta, as ciclovias e seu poder de transformação têm ocupado boa parte do noticiário na capital paulista.

 

Recentemente um grupo de moradores e comerciantes de Santa Cecília, na região central da cidade, se reuniu no Conseg (Conselho Comunitário de Segurança) do bairro defendendo a retirada da estrutura cicloviária recém-implantada, alegando suposto prejuízo ao comércio, ao fluxo de veículos e às necessidades de estacionamento para seus automóveis.

 

O debate esquentou, ocupou a mídia e culminou num evento realizado nesta segunda-feira (25) quando um grupo de mais de 100 ciclistas se reuniu em uma bicicletada (Veja as fotos) pelas ruas da região, de forma organizada e pacífica, convidando os moradores a pedalar e estimulando o uso da nova ciclovia. 

 

A discussão evidencia o poder de transformação da bicicleta: o equipamento é capaz de transformar não só o seu usuário, física, social ou psicologicamente, mas também o ambiente em que ele está inserido, sempre para melhor. 

 

Nesta entrevista concedida ao Mobilize Brasil, a jornalista e ativista Aline Cavalcante rejeita o título de “cicloativista” e defende um ativismo em prol da cidade, utilizando a bicicleta como meio. Aline é uma das idealizadoras do Las Magrelas Bar e do coletivo oGangorra; escreve para o Vá de Bike e coordena as redes sociais do portal Bike É Legal

 

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O cicloativismo em São Paulo tem gerado resultados concretos, de transformação da cidade e das políticas públicas de mobilidade. Na sua opinião, em que momento o paulistano acordou para a bicicleta?

A virada foi quando tudo parou. Em 2009/2010 tivemos picos de 400 km de congestionamentos na cidade; foi na mesma época da inauguração da ponte estaiada, na zona sul da capital. Aquela ponte, onde não há passarela para pedestres ou permissão para pedalar, é o símbolo máximo da cultura do automóvel. Costumamos dizer que o congestionamento é o maior cicloativista de São Paulo, mas a poluição também é protagonista. As bicicletadas também tiveram um papel importante, mas por ser um movimento horizontal ela muda sempre, adquire as características dos grupos que participam em determinado momento. Em 2008 muitos dos cicloativistas que conhecemos estavam lá, pedalando juntos, em grupos nunca inferiores a 500 ciclistas. Esses eventos foram e ainda são importantes, pois não existe nada mais potencializador de transformação do que o encontro de pessoas. 

 

Por falar no encontro de pessoas, qual é em sua opinião a importância da participação da sociedade nas políticas públicas de mobilidade?

Participar é essencial. A política, mesmo a política partidária, é feita por pessoas e para as pessoas. Quanto mais próximos nós estivermos de nossos representantes, melhor. Quando você delega, de certa forma abre mão de lutar e mostrar do que você está a fim. O cidadão é quem deve criar as demandas e mesmo os bons políticos precisam de pessoas ou grupos com demandas. Os coletivos, associações, empresas, tudo tem que funcionar para termos a vigilância participativa. Um exemplo: o projeto da ciclovia na avenida Paulista diz que ela será no canteiro central. Muitos grupos discordam, pois além da dificuldade de acesso, tira espaço das árvores e de um possível corredor de ônibus. A população, os usuários, precisam ser ouvidos. A ciclovia se não for bem-feita pode trazer o efeito contrário do desejado, isolando o ciclista. A premissa ao fazer uma ciclovia não pode ser a de tirar o ciclista do caminho. 

 

São Paulo está caminhando para ter 400 km de ciclovias. Falta muita coisa para ser uma cidade amigável?

A cidade tem que ter ciclovias, é uma grande conquista para todos, mas precisamos também acalmar as ruas. O Traffic Calming (técnicas para reduzir a velocidade dos carros e com isso melhorar a relação da via com o pedestre) salva muito mais vidas do que a criação de ciclovias, por exemplo. Uma infraestrutura adequada muda a cidade e o investimento nos espaços públicos pode mudar o comportamento das pessoas. Estamos evoluindo muito, não há dúvida, mas ainda há muito o que fazer.

 

A que você atribui o potencial transformador da bicicleta?

Ela consegue humanizar novamente as cidades, promove ambientes mais seguros e melhora a qualidade de vida. É unânime, ninguém a odeia e a transformação é inevitável porque a bicicleta é alegre, é lúdica, é divertida. Mas quando a gente luta por uma cidade melhor, não é pela bicicleta, é pela cidade. A bicicleta não é o fim, entende? É o meio. É por isso que não me considero uma cicloativista, mas uma ativista pela cidade. A bicicleta não é individual, ela é individual com potencial coletivo. A praça do ciclista, na avenida Paulista, é um bom exemplo. Ninguém planejou a praça, ela foi acontecendo e se transformando à medida que os grupos passaram a ocupá-la. Aos poucos estamos vendo a criação de mecanismos que equilibram os pontos negativos da cidade e a bicicleta faz parte disso. 

 

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