Prefeituras em diferentes regiões do país têm adotado tecnologias baseadas em dados para transformar a forma como monitoram os espaços urbanos, como as ruas, praças e, especialmente, as calçadas públicas. A novidade, agora, é a utilização da tecnologia e inteligência artificial (I.A.) para detectar problemas e programar manutenções.
O Censo IBGE 2022 mostrou que 84% da população urbana brasileira reside em ruas com algum tipo de passeio. O resultado parece bom, mas apenas 18% dessas "calçadas" estão livres de buracos, degraus e outros obstáculos. Em relação às rampas de acessibilidade, o quadro é ainda pior: somente 15,2% dos residentes contam com essa infraestrutura que permite a travessia segura de idosos, mães com carrinhos de bebê, caminhantes com malas e, claro, as pessoas com algum tipo de deficiência. Na prática, isso significa que mais de 119 milhões de brasileiros estão excluídos do direito básico de circular com segurança e autonomia.
Os dados sobre as condições reais dessa infraestrutura urbana são escassos e desatualizados, dependendo de reclamações pontuais feitas por moradores ou de inspeções manuais com frequência limitada. Exemplos são as campanhas Calçadas do Brasil 2012 e 2019, além das ações Calçada Cilada, que revelaram milhares de problemas em todas as partes do país. E em 2024 o Mobilize Brasil publicou a seção Uma Rua Cada Dia, com imagens de ruas e calçadas em centenas de cidades, todas repletas de desafios para quem caminha ou circula em cadeiras de rodas.

Câmera instalada em veículo para monitoramento das vias Foto: Mapzer
Câmeras e inteligência artificial
Mais recentemente, com base em imagens obtidas por "câmeras inteligentes", alguns municípios começaram a monitorar suas vias com apoio de inteligência artificial. Uma dessas iniciativas é promovida pela startup brasileira Mapzer, que desenvolveu uma tecnologia capaz de identificar até 32 tipos de ocorrências urbanas por meio de veículos equipados com câmeras, sensores e I.A.
Segundo Pierre Damasio, diretor da empresa, a tecnologia já foi aplicada em mais de 200 municípios desde que entrou em operação, impactando a gestão pública de zeladoria em diferentes regiões do país e beneficiando mais de 5 milhões de pessoas. A vantagem da tecnologia, explica Damasio, está na possibilidade de entregar diagnósticos completos e contínuos, com 100% de cobertura do perímetro urbano, o que permite a atuação das prefeituras de forma preventiva.
Apenas em 2024, a ferramenta identificou 32.658 pontos críticos relacionados à acessibilidade em calçadas. Os dados geram dashboards georreferenciados que têm sido utilizados por gestões públicas para embasar planos de mobilidade urbana, licitações de obras e decisões sobre onde intervir primeiro. Essa abordagem também favorece a redução de custos: identificar um ponto crítico antes do agravamento evita intervenções emergenciais mais caras, além de prevenir acidentes e ampliar o alcance dos serviços urbanos.
A expectativa é que soluções como essa ganhem maior escala nos próximos anos, especialmente diante de dois fatores emergentes: o envelhecimento da população brasileira, que até 2030 terá mais idosos do que crianças, as necessidades de mobilidade sustentável e a intensificação dos eventos climáticos extremos, que exigem cidades mais resilientes e adaptadas à diversidade de seus habitantes.
Por fim, resta o desafio político de estimular os prefeitos a priorizarem a velha e maltratada calçada.
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