Não falta planejamento, faltam conexões

A cidade é um organismo interdisciplinar e complexo que deve ser pensado em sua totalidade

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Fonte: Blog Cidades para Pessoas  |  Autor: Natália Garcia*  |  Postado em: 11 de julho de 2013

Trânsito na Av. 23 de Maio, em São Paulo

Trânsito na Av. 23 de Maio, em SP

créditos: Natália Garcia

 

(Eu não gosto muito de dividir a cidade em setores – mobilidade, habitação, gestão do lixo, etc – e discutí-los separadamente. A cidade é um organismo interdisciplinar e complexo que deve ser pensado em sua totalidade. Mas de vez em quando esse olhar mais focado é necessário para mapear problemas. Por isso, esse será um post focado apenas no eixo mobilidade, desconsiderando todos os outros.) 

 

Se eu fosse apontar um problema central para a falência da mobilidade em São Paulo (e isso vale para qualquer metrópole brasileira), não diria que é a falta de vontade política, recursos, projetos, infraestrutura, planos, ou especialistas; mas que é a falta de conexão entre eles.

 

Em São Paulo, a CET cuida dos carros, a SPTrans dos ônibus, o metrô e os trens da CPTM não são de responsabilidade da prefeitura, mas do Governo do Estado – e são geridos por agências diferentes. Pedestres e ciclistas se salvam como podem, pois não existe um órgão de mobilidade dedicado a eles – ainda que um terço das viagens feitas na cidade sejam feitas a pé ou de bicicleta.

 

Essa configuração de poderes resulta em uma gestão desarticulada. Não basta que todos os órgãos existentes tenham o objetivo em comum de melhorar a mobilidade na cidade se eles não conversarem entre si. É preciso, ao contrário, que trabalhem em parceria para prover uma rede integrada de possibilidades de deslocamentos para as pessoas. Essa é a função do Transport for London, por exemplo, uma agência da prefeitura que reúne toda a gestão da mobilidade na cidade, centraliza informações como dados e indicadores e estabelece planos integrados entre ônibus, bicicletas, metrô, trem e carros.

 

O mais próximo disso que conseguimos chegar em São Paulo é o Plano Integrado de Transportes Urbanos, PITU. Como a CET, Sptrans, Metrô e CPTM não conseguem se planejar em parceria, eles contratam uma equipe para fazer isso por eles. Nosso último PITU foi feito em 2005 e planejou uma série de coisas para que São Paulo tivesse uma rede integrada de mobilidade:

 

 

Se examinarmos o primeiro período (2006-2012), vemos que dos 32 km planejados de metrô, 16 foram feitos. Dos 57 km de vias exclusivas para ônibus, nenhuma foi feita. Do trem que integraria os aeroportos, nem sinal. E deslocamentos a pé e de bicicleta nem foram mencionados.

 

O problema é que o PITU é um plano, não um projeto de gestão integrada. “Quando apresentamos o PITU, todos nos aplaudiram, mas na prática nada mudou”, conta um de seus consultores, Mário Garcia. Na semana seguinte, CET, SPtrans, CPTM e Metrô voltaram aos seus escritórios e tocaram seu trabalho, cada um do seu jeito. Um defendendo fluidez de veículos, outro querendo aumentar a velocidade média dos ônibus, outro ainda pedindo dinheiro à união para mais investimentos em infraestrutura. E todos, na prática, brigando por espaço nos deslocamentos da cidade.

 

Se toda essa desarticulação inviabiliza o cumprimento de prazos como os estabelecidos pelo PITU, que dirá a execução de projetos inovadores que se propõem a melhorar a mobilidade reinventando a cidade. Esses projetos existem. Meu exemplo favorito é o Metrópole Fluvial, que quer ativar os rios como eixos da mobilidade logística e de lazer em São Paulo.

 

Com tanta desarticulação política e problemas tão complexos ligados à mobilidade, não sobra espaço para debatermos como podemos reinventar a cidade. E aí, o bem estar das pessoas é sempre adiado porque os gestores estão ocupados demais tentando resolver o trânsito.

 

*Natália Garcia é jornalista especializada em planejamento urbano e tem como principal ferramenta de trabalho uma bicicleta dobrável, que usa para explorar as cidades. 





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Comentários

tom - 11 de Julho de 2013 às 16:56 Positivo 0 Negativo 0

"E deslocamentos a pé e de bicicleta nem foram mencionados." acho que foram timidamente mencionados em TNM, abs!

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