Por uma cidade que valorize o pedestre e o ciclista

Entrevista com Luiza Gomide, diretora de Mobilidade Urbana do Ministério das Cidades

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Fonte: Mobilize Brasil  |  Autor: Regina Rocha  |  Postado em: 07 de fevereiro de 2012

Luiza Gomide (dir.) discute PAC Mobilidade Urbana

Luiza Gomide (dir.) discute PAC Mobilidade Urbana

créditos: Robson Nunes

O Ministério das Cidades deve divulgar, no final deste mês de fevereiro, a relação das cidades brasileiras que receberão investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento - PAC Mobilidade Grandes Cidades, importante fonte de recursos para obras de mobilidade urbana. Esta e outras informações foram dadas por Luiza Gomide Vianna, diretora de Mobilidade Urbana da Secretaria Nacional de Transporte e da Mobilidade Urbana (SeMob) do Ministério das Cidades. No MC desde 2004, a executiva está otimista quanto à nova lei de diretrizes da Política Nacional da Mobilidade Urbana. Luiza é arquiteta urbanista, formada pela FAU USP em 1991, e conversou com a repórter do Mobilize Brasil.

 

O que muda na atuação do Ministério das Cidades com a aprovação da Política Nacional da Mobilidade Urbana?

É um momento especial, histórico, o da vigência da nova lei. Mas vale lembrar que sua aprovação é resultado de uma longa construção política que vimos defendendo desde o lançamento das diretrizes do Ministério das Cidades, em 2003. Agora que virou lei, é um instrumento a mais, que fortalece nosso trabalho, pois força os municípios a cumprirem suas metas de mobilidade, ou então arcarem com o ônus de não receberem recursos federais. Na verdade a lei não traz uma ideia nova; como disse, seus conceitos foram gestados, desde o princípio, pela defesa e priorização da mobilidade sustentável, pela valorização do pedestre e do ciclista, pontos de empenho do nosso trabalho. A diferença agora é que a lei entra para a agenda dos governos federal, estaduais e municipais, o que facilita sua implementação.

 

Já há um plano de atuação do Ministério das Cidades para fazer valer esta nova lei?

Não definimos ainda uma estratégia de ação. Ocorre que, com a vigência da lei, vários eventos começam a pipocar pelo país; aliás, o primeiro deles foi um seminário realizado ontem mesmo (2) em Aracaju. Nosso papel é, sempre que chamados, participar desses debates. E temos como orientar os municípios - por exemplo, o PlanMob, um caderno de referência que o MC lançou em 2006, indica o que é necessário à elaboração de planos de mobilidade nos planos diretores de cidades, principalmente as com mais 500 mil habitantes, que obrigatoriamente devem ter plano diretor.

Nessas cidades, o trânsito complicado é uma externalidade negativa do modelo atual do transporte individual, e a lei vem para corrigir uma injustiça: a do automóvel, responsável por 61% da poluição do ar, utilizado por 30% da população, e apesar de minoritário (70% das pessoas vão de ônibus e bicicleta) tratado ainda pelos gestores públicos com prioridade.

 

Como mudar esta visão, e redirecionar os investimentos majoritariamente para o transporte coletivo?

Além dos gestores, é importante que a ideia seja abraçada pela população, que os movimentos sociais se apropriem deste ideal. Quanto aos investimentos, após longo período de análise e debate dos projetos inscritos no PAC Mobilidade Grandes Cidades, no final deste mês de fevereiro anunciaremos o resultado. Só participam cidades que tenham planos de mobilidade urbana. Estão cadastrados 24 municípios, todos com mais de 700 mil habitantes - o que representa 40% da população brasileira! A análise dos projetos foi demorada, até porque é a primeira vez que entramos num processo seletivo desse porte. Exigiu identificar as prioridades de investimento, avaliando questões complexas como: a proposta atende a um casamento entre o uso do solo e os eixos viários?, coisas assim.

 

Pode detalhar estes investimentos?

Em linhas gerais, temos para investir R$ 18 bilhões, e uma demanda - propostas cadastradas - por R$ 41 bilhões; destes, R$ 10 bi são em contrapartida dos municípios. Ao todo, foram inscritas 69 propostas, sendo 53% para faixas exclusivas de ônibus (corredores e BRTs); 10% para obras de metrô; 12% obras viárias; 9% para VLTs. Dos 41 bilhões demandados, 54% (ou R$ 18,3 bi) são para corredores + BRTs; 29% dos recursos referem-se a obras de metrô; e 8% (cerca de R$ 3 bi) para VLTs.

 

Há quem critique a obra de um transporte como o metrô, alegando que o custo de sua implantação é bem mais alto do que, por exemplo, o corredor de ônibus...

...Mas temos de encarar o desafio de construí-lo! Claro que vai depender da análise de cada projeto, em nem todos os casos é possível apoiar. Mas é um sistema de alta capacidade, importante para cidades médias e grandes, e tem a vantagem de não ocupar o espaço já construído, evitando desapropriações e reassentamentos como acontece com os corredores. Outro sistema, o VLT, em princípio também deve ser apoiado. Não é curioso: quem viaja para o exterior se encanta com eles, então, porque não o temos aqui?! Nosso solo urbano por acaso é diferente do das cidades europeias por onde passa o VLT? É certo que não temos experiência nesse tipo de transporte, por isso o debate pode demorar, mas tenho certeza de que, dentro de uns oito anos, depois que realizarmos eventos como o da Copa do Mundo, teremos no país uma situação diferenciada de mobilidade urbana, e as críticas vão desaparecer.

 

E quanto às bicicletas, o MC apoia esta alternativa de transporte sustentável?

Não dispomos de um programa especificamente voltado à bicicleta. Porque temos que fazer escolhas e, ao distribuir recursos, o transporte coletivo está na frente. Mas entendemos que a bicicleta não se descola desse contexto, ela entra nos projetos como elemento de integração com o transporte coletivo. Nos municípios menores, onde as características de mobilidade são diferentes, em viagens de curta distância, o papel da bicicleta é naturalmente outro. Já nas cidades grandes, o que posso dizer é que todos os projetos que apoiamos contemplam estruturas como bicicletários nos terminais, e ciclovias, porque há essa preocupação com a mobilidade sustentável.

A pergunta que devemos fazer é: qual a cidade que queremos? Eu acredito firmemente naquela ideia de que o ser humano passará a ocupar o espaço público, um espaço valorizado, onde poderá caminhar por calçadas amplas, arborizadas e ajardinadas, acessíveis. Este, que hoje é apontado como um diferencial das cidades europeias também deve ser visto como um caminho a conquistar.

 

 

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Comentários

Rinaldo Amud - 07 de Fevereiro de 2012 às 21:22 Positivo 1 Negativo 0

Nossos políticos administradores, devem copiar modelos como Munique na Alemanha, que apesar de ser uma cidade muito antiga, tem uma rede de ciclovias por toda a cidade, dando a oportunidade do cidadão escolher o modo de se locomover.

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