Menos transporte elevou contágio nas periferias

Estudo mostra que redução de frotas nas grandes cidades durante a pandemia gerou aumento de 80% na lotação de ônibus e trens, especialmente nas áreas mais periféricas

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Fonte: Agência Fapesp  |  Autor: Agência Fapesp  |  Postado em: 16 de junho de 2020

Embarque em trem da CPTM (SP) em hora de pico

Embarque em trem da CPTM (SP) em hora de pico

créditos: Victor Moriyama/The New York Times


Mudanças operacionais realizadas pelos governos estaduais e municipais no transporte público, como redução na circulação de ônibus, trens e metrô, não acompanharam adequadamente a demanda e aumentaram as lotações dos transportes públicos, particularmente nas periferias de grandes cidades como São Paulo, Rio de Janeiro e Curitiba, o que aumentou o risco de contágio da covid-19.

 

A conclusão é de um estudo coordenado pelo Centro de Estudos da Metrópole (CEM), que analisou a evolução da procura e a redução da frota do transporte público nos meses de março, abril e maio. O estudo foi coordenado por Mariana Giannotti, professora da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP) e pesquisadora do Centro de Estudos da Metrópole (CEM), com a participação dos pesquisadores Tainá Bittencourt e Pedro Logiodice, ambos da Poli-USP e do CEM.



De acordo com a pesquisa, as alterações feitas no sistema de transporte durante a pandemia elevaram em até 80% a frequência nas estações nas regiões periféricas. “A redução da circulação de ônibus provoca lotações, aglomerações e aumenta, assim, o risco de contágio da população. As desigualdades sociais e de raça nos deslocamentos urbanos aumentam o risco de contágio em moradores das periferias”, afirmam os pesquisadores.

 

Em um cenário de retomada das atividades não essenciais, os pesquisadores sugerem medidas para redução dos riscos, como a utilização de veículos adicionais em trechos de maior lotação, somados a veículos expressos e diretos entre grandes terminais e polos de origem e destino de viagens. “Isso pode criar pontos de alívio e reduzir os custos associados ao maior número de veículos em operação”, destacam.

 

O reforço de linhas locais e capilares que conectam as diferentes áreas da cidade às linhas estruturais de transporte público de média e alta capacidade também pode contribuir para reduzir a pressão por mais ônibus e aumentar a frequência do serviço.

 

“O estudo indica que é importante olhar a cidade como um todo, mas não apenas de forma agregada. As ações devem considerar as diferenças presentes no território para atuar de forma condizente com a realidade de cada região, em busca de minimizar o impacto das desigualdades socioespaciais”, afirma Giannotti.

 

Desequilíbrio entre demanda e oferta
As políticas de isolamento restritivas diminuíram a circulação de pessoas. Várias cidades reduziram a oferta de ônibus, trens e metrôs. Mais de 300 linhas foram suspensas na Grande São Paulo e quase 600 na Grande Rio, por exemplo. No entanto, dentro de cada área urbana, a demanda e a oferta caíram em proporções diferentes e de forma não homogênea. Parte das linhas de ônibus que circulam na periferia registrou aumento da demanda. Essas rotas atendem a população que enfrenta condições de trabalho mais precárias, recebem menor remuneração, se deslocam por mais tempo e em piores condições.

 

Nas regiões mais afastadas, a lotação dos ônibus se mantém muito próxima dos altos níveis observados antes da pandemia. “Nesse cenário, em que a redução da oferta é proporcional à redução da demanda, a lotação estimada para grande parte das linhas periféricas seria maior do que seis passageiros por metro quadrado, o que corresponde a uma distância entre pessoas muito menor do que os dois metros recomendados pelas agências e organizações de saúde, resultando em altíssimo risco de contaminação pelo vírus”, alertam os pesquisadores.

 

A suspensão de rotas e a redução da frequência dos ônibus, aliadas às restrições ao tráfego de veículos, provocaram a migração dos passageiros para outros modos de transporte que continuaram operando, como o metroferroviário. “A frequência às estações de metrô e trem em São Paulo e Rio de Janeiro no início de maio, por exemplo, estava em 30% do usual nas regiões centrais, onde as condições sociais para o isolamento social são maiores. Nas regiões periféricas, a demanda seguiu os padrões anteriores à pandemia e, em alguns casos, chegou a ser até 80% maior”, contabilizam.

 

Com base nesse cenário, os pesquisadores propuseram medidas que podem reduzir as desigualdades relacionadas ao transporte, apresentando simulações do impacto de diferentes cenários de isolamento social para a cidade de São Paulo. Na simulação com operação total da frota, o risco de contaminação causada pela aglomeração nos deslocamentos com transporte público é consideravelmente reduzido com as políticas de isolamento social.

 

 

 

Com taxa de isolamento médio de 45% e a premissa de disponibilidade de assentos para todos os usuários – sem aglomerações no corredor dos veículos –, a recomendação é de aumento da oferta de ônibus em circulação em relação à operação anterior à pandemia, de modo a garantir deslocamentos mais seguros em termos do risco de contaminação. No centro, a frota poderia ser reduzida a níveis mais baixos, porém deveria manter a garantia de uma frequência horária mínima.

 

Na simulação de um quadro pós-isolamento social e com a retomada de 100% dos deslocamentos, foi adotado como critério a taxa de lotação máxima de dois passageiros por metro quadrado para garantir algum espaço entre passageiros em pé. Nesse cenário a recomendação é igual à anterior, mas grande parte das linhas que servem as regiões periféricas teria que receber mais do que o dobro do número de veículos que operam usualmente, ou contar com alternativas complementares de transportes como vans ou similares. 

 

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Rede Pesquisa Solidária Nota Técnica nº 10
Estudo mostra que redução de frotas nas grandes cidades durante a pandemia gerou aumento de 80% na lotação de ônibus e trens, especialmente nas áreas mais periféricas. Trabalho foi realizado pela Rede de Pesquisa Solidária com apoio do CEM-USP

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