Países da Europa rompem com o "tradicional transporte masculino"

Pesquisas mostram: o carro é mais usado por homens. Agora, várias cidades começam a priorizar a mobilidade ativa/transporte público, opções mais adotadas pelas mulheres

Notícias
 

Fonte: Bloomberg/ Mobilize (trad./edição)  |  Autor: Carolynn Look e Elisabeth Behrmann  |  Postado em: 06 de julho de 2021

Via estreita para pedestres na ponte Carl-Ulrich/

Via estreita para pedestres na ponte Carl-Ulrich/ Offenbach

créditos: Alex Kraus/ Bloomberg

Para chegar às lojas e restaurantes do outro lado do rio Main, no distrito alemão de Offenbach, os pedestres do lado leste de Frankfurt precisam se  esquivar de bicicletas e se apertar em um caminho que é pouco mais largo do que um carrinho de bebê.

 

Em períodos de maior movimento, o problema nessa ponte muitas vezes força mães e filhos a pisarem momentaneamente na rua. Os motoristas de automóveis, por outro lado, têm duas faixas generosas. É um sinal da prioridade desproporcional dada no planejamento urbano ao uso dessa opção de mobilidade tradicionalmente preferida pelos homens. 

 

Mas, esse conceito vem sendo repensado: “Precisamos encontrar uma abordagem inclusiva e universal”, defende Janina Albrecht, designer de mobilidade que ajudou a introduzir as ciclovias que conectam blocos residenciais em Offenbach com escolas e áreas comerciais. “Precisamos de lugares inclusivos, sensíveis ao gênero, sem barreiras.”

 

À medida que cidades da Europa buscam tornar o transporte sustentável, também as questões de gênero entram nessa abordagem. Na Alemanha, com o uso intensivo de automóveis, os homens viajam quase o dobro da distância de carro se comparado às mulheres, que têm maior probabilidade de caminhar e usar o transporte público.  

 

Dados de uma pesquisa (2020) sobre o uso de transporte/mês, realizada pela empresa de planejamento Ramboll. Foram ouvidas pessoas nas seguintes cidades: Helsinque, Vantaa, Espoo, Oslo, Estocolmo, Copenhague, Berlim e Delhi.

 

Pressão no urbanismo

A novidade é que agora o planejamento urbano está sob pressão, e aponta para mudanças que tornarão as vias menos focadas no desejo dessa parcela masculina em seus deslocamentos para o trabalho.

 

Paris, Barcelona e Viena estão implementando políticas para desencorajar o tráfego de automóveis e favorecer pedestres e ciclistas. A capital francesa busca garantir que residentes tenham todos os serviços necessários em 15 minutos a pé, de bicicleta ou de transporte público. Barcelona está restringindo o tráfego nas principais ruas e avenidas, enquanto a Áustria está implementando este ano o acesso nacional ao transporte público por uma taxa anual fixa de 3 euros (US$ 3,60) por dia.

 

Mas a questão é mais complexa do que o dilema carros versus bicicletas. Em algumas cidades, as mulheres pedalam menos, provavelmente porque as pistas não são largas ou seguras o suficiente, especialmente tendo cadeiras de criança acopladas, o que reforça a importância do desenho urbano voltar-se prioritariamente para esse meio de transporte. 

 

Outra vez, não há como negar que os sistemas centrados em carros enfrentam forte pressão. Numerosas iniciativas vão exigindo restrições a veículos pessoais. Uma dos mais radicais está em Berlim, onde ativistas pressionam por um plebiscito que proibiria automóveis particulares no centro da cidade em favor do transporte público, a pé e de bicicleta.

 

Diversidade

Sabe-se que as atividades diárias realizadas por mulheres geralmente incluem deslocamentos para locais relacionados a creches, tarefas domésticas, empregos... e esses trajetos criam demandas de transporte que vão bem além de uma simples solução voltada ao trajeto trabalho-casa. 

 

Já quando a diversidade é incorporada ao processo de planejamento, as mudanças de perfil de público a usar o transporte são perceptíveis. Em Oslo, por exemplo, as estações de compartilhamento de bicicletas foram inicialmente colocadas apenas em áreas centrais, onde ficam os escritórios dominados por homens. A aceitação da bike entre as mulheres foi limitada até o momento em que também foram adicionadas estações em áreas periféricas, próximas a zonas residenciais.

 

Para repensar o modelo do transporte é preciso, no entanto, ir além das diferenças de gênero. O planejamento encerra desafios semelhantes no caso de atendimento a migrantes, deficientes físicos, ou simplesmente a pessoas de baixo poder aquisitivo, que não se deslocarão em carro próprio.

 

Nesse sentido, para ampliar a oferta de mobilidade, a Áustria tem feito progressos com a adoção de um bilhete único no transporte público. O país também desistiu, no fim do ano passado, da construção de uma rodovia regional e, em vez disso, gastará 1,8 bilhão de euros na melhoria dos serviços de trem, estradas rurais e oferecendo benefícios para a mobilidade de última milha.

 

“Virar o sistema de mobilidade de cabeça para baixo é o grande trabalho que temos pela frente nos próximos anos”, declarou a ministra do Clima, Energia e Política de Transporte da Áustria, Leonore Gewessler, acrescentando: “Para conseguir isso, vamos precisar sem dúvida de um plano de mobilidade sustentável."

 

Leia também:
Países europeus querem incluir a bicicleta na mobilidade pós-pandemia
Ciclovia, áreas verdes: o desafio europeu de reaver moradores do campo
Passeio de bike por Paris vai marcar o Dia Mundial dos Refugiados
Mulheres jovens e negras são a maioria nos ônibus de São Paulo
França quer incentivar troca de carro velho por bicicleta
Elas vão de transporte público e a pé... De carro, mais por privacidade


  • Compartilhe:
  • Share on Google+

Comentários

Nenhum comentário até o momento. Seja o primeiro!!!

Clique aqui e deixe seu comentário