Texto e fotos: Uirá Lourenço

Moro na Asa Norte e tenho o privilégio de andar e pedalar por locais sombreados. Além da sombra, as árvores abrigam muitas espécies de pássaros: sabiá, joão de barro, bem-te-vi e periquito, entre outros. Nos gramados se podem ver as corujinhas e curicacas.
Aproveito as andanças diárias para fazer a colheita. O período está bom para pegar amora, acerola e jenipapo. A safra de mangas está por vir, preciso arrumar espaço no congelador para produzir polpa.


Jenipapo e manga são algumas das frutas que se podem colher na cidade.
Espaços com banquinhos e plantas fazem grande diferença na cidade. Permitem encontros (casuais e programados), brincadeiras entre crianças, uma parada para relaxar e fazer piquenique. É fácil notar como as pessoas apreciam áreas verdes.
No início da Asa Norte, próximo de dois centros comerciais (ID e Brasília Shopping), há um gramado com árvores baixas em que as pessoas se encontram para almoçar e tirar um cochilo. As áreas sombreadas das árvores são disputadas no horário de almoço.

Espaço sombreado no início da Asa Norte: encontro e almoço ao ar livre.
Há locais especiais na Asa Norte. A quadra 315N tem um cantinho com bancos, mesas e trepadeiras. A praça tem ainda espaço para as corujas, fonte de água e horta. Outro dia dois jovens se reuniam para cantar louvor nos bancos sombreados. Gosto de passar por ali para relaxar a mente, ler e ouvir o canto dos diferentes pássaros que são atraídos.
Em meio às pistas e aos amplos estacionamentos, as áreas com grama e árvores tornam-se um oásis. Adoraria que o governo local reconhecesse os inúmeros benefícios das árvores e plantasse mais. Infelizmente, muitas vezes ocorrem podas drásticas ou até cortes sem justificativa clara.

Espaço com sombra e bancos na 315 Norte.
No caso de árvores frutíferas, as podas radicais reduzem a safra e dificultam a colheita. Há abacateiros pela Asa Norte com galhos muito altos e inalcançáveis, mesmo com auxílio de vara.
Dois fatos recentes demonstram como, a despeito da fama de cidade parque e da arborização privilegiada nas Asas Norte e Sul, ainda temos que avançar na proteção e valorização das áreas verdes.
Uma bela gameleira que ficava na quadra 704/5 Norte foi dizimada. Primeiro ela passou por poda radical, e recentemente ela sofreu incêndio criminoso. Segundo a versão noticiada, o homem que tocou fogo queria entreter o filho, que estava junto (a ‘brincadeira’ foi captada por câmera próxima).
Na 713 Norte uma palmeira foi derrubada durante a obra de revitalização na W3 Norte. Era um belo exemplar, que atraía muitas aves, inclusive araras.


Na Asa Norte, gameleira queimada e cortada (à esquerda); palmeira que não existe mais, foi cortada em obra do governo (à direita, foto de março/2018).
As duas árvores eram antigas e majestosas, com as quais os vizinhos tinham uma ligação especial. Nas redes sociais houve repercussão após a perda das árvores. Na gameleira havia um parquinho infantil e alguns se lembram de forma saudosa de curtir o local em família. Quem mora perto da 713N se recorda das araras que se reuniam e se alimentavam na palmeira.
O Eixão do Lazer, aos domingos e feriados, é outro lugar em que se nota a importância do verde. As pistas ficam movimentadas, com pessoas caminhando e pedalando. E nos canteiros, sob a sombra das árvores, ocorrem atividades diversas: piqueniques, yoga, música ao vivo e festas de aniversário. Nos horários mais quentes (entre 11h e 15h) o movimento cai bastante nas pistas asfaltadas, mas nas áreas com sombra a animação continua!

Grupo se reúne na sombra das árvores, no Eixão do Lazer.
Em reportagem recente, o arquiteto e urbanista Luís Eduardo Costa, que foi secretário de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano em Campo Grande (MS), destacou as áreas verdes como um ativo de saúde pública:
“A arborização não é apenas um elemento de paisagem. É um ativo de saúde pública. As árvores reduzem a temperatura, filtram poluentes, favorecem a saúde mental e aumentam a resiliência das cidades diante das mudanças climáticas.” Ele complementa: “As cidades precisam ser planejadas para o bem-estar e não apenas para o tráfego de veículos ou o lucro imobiliário. Cuidar das árvores é cuidar das pessoas”.
Com as novas pistas, os viadutos (trevos rodoviários) e estacionamentos projetados e em construção no Distrito Federal a tendência é termos ainda menos árvores e mais asfalto. E assim se formam novas ilhas de calor.
Ao longo das vias ampliadas, que passaram por obras, constata-se o desconforto térmico. Passei a pé e de bicicleta pelo Setor Policial e pelo viaduto entre o bairro Sudoeste e o Parque da Cidade. A aridez, a escassez de árvores (dizimadas durante a obra), tornam a caminhada penosa. Lembro com saudade das paineiras, dos ipês e de toda a fauna associada (coruja, quero-quero, joão-de-barro, pica-pau, curicaca e arara) que viviam por lá.


Caminhos áridos após obras no Setor Policial (à esquerda) e na EPIG, próximo ao bairro Sudoeste (à direita).
Em tempo de extremos climáticos e com a COP-30 (Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima) prestes a ocorrer em Belém, espero que nossas autoridades se sensibilizem para a importância das áreas verdes, que trazem tantos benefícios. Que possamos contar com o apoio do governo para plantar cada vez mais e abandonar de vez o modelo rodoviarista caro e poluente, voltado ao automóvel, que engole áreas verdes e impermeabiliza grandes áreas.
VÍDEOS
Uirá Lourenço