Porto Alegre tem surpresas (boas e ruins) no caminho do pedestre

A capital gaúcha tem várias leis e guias para calçadas e acessibilidade. Mas as condições para caminhar na cidade estão longe do desejável

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Fonte: Mobilize Brasil  |  Autor: Mobilize Brasil / Chrystiane Knapp  |  Postado em: 01 de abril de 2019

Travessia de via nas proximidades de escola técnic

Travessia de via perto de escola técnica em Porto Alegre

créditos: Chrystiane Knapp

Não há como dizer que Porto Alegre seja uma cidade caminhável. Há sim algumas ruas que facilitam o acesso e deslocamento de pessoas com mobilidade reduzida ou quem anda em cadeira de rodas, empurrando carrinhos etc. Mas, no entanto, muitas outras não permitem isso, explica a arquiteta urbanista Chrystiane Knapp, uma das colaboradoras da Campanha Calçadas do Brasil na capital gaúcha.  

E isso, explica Chrystiane, ocorre não somente em regiões com topografia acidentada, mas também em trajetos planos. "Encontramos obstáculos no meio de uma quadra - como entradas de carros - ou problemas para atravessar as ruas, especialmente para pessoas com deficiência", exemplifica a urbanistaem entrevista concedida por email.

 

Há algum plano ou programa em Porto Alegre para a melhoria de calçadas, sinalização e equipamentos de apoio para a mobilidade a pé?
Sim, a cidade conta com legislações municipais específicas, tais como o decreto 17.302/2011, que dispõe sobre a pavimentação de passeios públicos; a lei 10.199/2007, sobre o Estatuto do Pedestre; a lei 8.317/99 (sobre a eliminação de barreiras arquitetônicas em edificações e logradouros de uso público); a lei 678/2011, que institui o Plano Diretor de Acessibilidade; e os dois guias da série “Minha calçada: eu cuido, eu curto”. Os guias fornecem uma compilação das legislações, de forma didática, explicativa e ilustrada com exemplos. Além disso, existe ainda a primeira versão do "Plano de Mobilidade Urbana de Porto Alegre: diagnóstico da mobilidade no município de Porto Alegre e sua interface metropolitana", do qual esperamos a versão final. 
 


Calçada no TRT 4


 São várias as ferramentas disponíveis na capital gaúcha  - entre legislações e organizações de incentivo à mobilidade a pé. Mas a fiscalização com relação à calçada “adequada” ainda é ineficiente, gerando muitos trechos que desestimulam à caminhada ou simplesmente não permitem uma circulação segura. Melhorar a fiscalização talvez resulte em calçadas mais acessíveis e capazes de incluir os diferentes grupos de usuários do espaço urbano. Mas, mesmo assim, ainda, fica o questionamento: atender às normas e legislações sobre calçadas permite o incentivo à mobilidade a pé? Uma calçada adequada é somente aquela que atende as normas e legislações? 

 

Existem organizações que trabalham pela melhoria da mobilidade a pé em Porto Alegre?
Em janeiro passado tivemos o encontro “Hackatown Porto Alegre Ed. Mobilidade”, que faz parte do planejamento de elaboração do plano de mobilidade. Nesse evento a cidade contou com a participação de várias organizações e iniciativas sociais, como a Minha Porto Alegre, WRI Brasil, Point-Facilitação Criativa, Shoot The Shit, Mercado Brasco e Global Shapers, além de representantes da sociedade civil. O prazo para conclusão termina agora em abril.
Com relação a organizações/programas que focam a mobilidade a pé, podemos citar ainda o “Viva o Centro a pé”, atividade que estimula passeios guiados a pé; e o “Free Walk Poa”, com passeios guiados gratuitos que contam as histórias dos lugares da cidade, conforme o roteiro. Destaque ainda para o “A pezito”, uma ação que desenvolve uma pedagogia urbana por meio de experiências a pé para reforçar a convivência, cidadania, saúde e alegria entre as crianças participantes. E há também o “transLab”, autodenominado como laboratório cidadão de inovação social para todos aqueles que querem transformar a cidade. 

 

Calçada na Câmara Municipal de Porto Alegre

 

Por que você resolveu "adotar" a Campanha Calçadas do Brasil?
Me interessei pela caminhabilidade um pouco antes de entrar no mestrado e hoje estou estudando o assunto na minha pesquisa. Acredito que todos vamos ganhar com esta oportunidade de conhecer um pouco mais a fundo a nossa cidade e as demais cidades que também estão sendo analisadas. Participar da campanha agrega valor a um olhar focado no usuário mais vulnerável do espaço urbano, o pedestre.

 

Como foram (estão sendo) selecionados os locais/trajetos a serem avaliados? Foi uma decisão individual ou coletiva?
A decisão foi coletiva. Marcamos locais de interesse em regiões que se encontram com maior densidade populacional, maior número de atropelamentos, maior número de mulheres, de idosos, de pessoas com deficiência (motora e visual) e de crianças, conforme categorizados pelo IBGE (2010).

 

Quando as avaliações foram feitas em Porto Alegre? Há ideia de ampliar essa avaliação? 
As avaliações estão sendo feitas por cada avaliador individualmente e logo juntaremos os materiais e discutiremos sobre o que foi observado. No momento, trocamos ideias e informações no grupo que ajudam e facilitam nossas avaliações.

 

E em relação aos critérios de avaliação? Você tem críticas ou sugestões aos critérios adotados pelo Mobilize? Poderia dar um exemplo?
Os formulários têm uma linguagem simples e de fácil compreensão. Apenas alguns itens podem não ser aplicados a alguns trechos de calçadas avaliadas, como por exemplo, os semáforos ou árvores na calçada. Nem todos os trechos de ruas têm semáforos, pelo que receberiam a nota zero, mesmo quando o trânsito local seja tranquilo e não exija um semáforo. E nem todos os trechos contam com árvores na calçada, embora possam receber uma boa sombra vinda de jardins das edificações adjacentes. Também há dúvidas sobre a necessidade de registrar a quantidade de árvores em cada trecho. Como isso vai ser avaliado? Entendemos que as avaliações seguem um roteiro e abrem também margem à interpretação qualitativa do avaliador, podendo este avaliar como positivo ou negativo o trecho, em situações como as referidas acima.  

 

De fato, há um certo nível de subjetividdade nos formulários. E nesses casos, os avaliadores podem incluir um comentário explicando o que encontraram no local.
Sim, mas embora a interpretação qualitativa possa ser descrita nos comentários, a avaliação por escala é bem objetiva. Acreditamos que essa parte dos formulários deva ser repensada na segunda fase da campanha.

 

O que se espera obter como produto final? Há algum plano para a concepção de soluções aos problemas encontrados?
Esperamos entender de que maneira as instituições públicas executaram suas calçadas e como estão “cuidando” delas. Conforme legislação municipal, o proprietário é o responsável pelo projeto, execução e manutenção de sua calçada, a hipótese é que as calçadas atenderiam aos padrões da norma e legislações vigentes, pois por serem instituições/equipamentos públicos deveriam dar o exemplo à população. Com certeza planos para concepções de soluções aos problemas encontrados irão surgir ao finalizar as avaliações. Por enquanto, ainda não foram elaborados. 

 

Quem é Chrystiane Knapp
Sou  arquiteta e urbanista, mestranda em Planejamento Urbano (UFRGS), sempre aprendendo, na busca de entender as complexidades da cidade, com o sonho de plantar uma semente na concepção de espaços públicos inclusivos e capazes de incentivar à mobilidade a pé. Prazer!

 

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