Em Porto Alegre, BRT bate cabeça com metrô

Cidade também investe em alternativas, como catamarãs e aeromóvel (Marcela Donini)

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Fonte: Mobilize Brasil  |  Autor: Estudo Mobilize 2011  |  Postado em: 17 de novembro de 2011

Porto Alegre - Estudo Mobilize 2011

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créditos: Estudo Mobilize 2011

Existe um carro para cada 2,7 habitantes de Porto Alegre. Enquanto a população aumentou 3,62% em dez anos, segundo dados do IBGE, a frota de automóveis cresceu 20,38% de 2005 a 2010.

 

O rápido avanço do índice de motorização da capital gaúcha se reflete em engarrafamentos em horários e pontos inéditos. Apesar disso, dos oito projetos previstos na Matriz de Responsabilidade para a Copa de 2014, apenas dois beneficiam diretamente o transporte coletivo público: a introdução de um sistema de Bus Rapid Transit (BRT) e o monitoramento dos corredores de ônibus.

 

Esta é uma das principais críticas do consultor Emílio Merino em relação ao planejamento de mobilidade urbana de Porto Alegre para receber o megaevento. “Em Barcelona, nas Olimpíadas de 1992, os organizadores reconheceram que deixaram de lado o coletivo e tiveram problemas com engarrafamentos, por exemplo. Para que as modificações para a Copa possam deixar um legado para a cidade no futuro, é preciso potencializar o transporte coletivo mais fortemente”, diz o analista, que acompanhou o início da elaboração desses projetos, quando trabalhava para a Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC).

 

Hoje afastado da gestão pública, o urbanista preocupa-se com a indefinição sobre como será o sistema BRT. No final de agosto, a prefeitura encaminhou para a Caixa Econômica Federal o projeto da primeira etapa, que corresponde à pavimentação dos corredores de ônibus das avenidas Protásio Alves e Osvaldo Aranha. O restante do projeto foi suspenso, enquanto a União avaliava a proposta do Metrô na cidade, cujas definições deverão alterar o sistema de ônibus.

 

No final de setembro, o governo federal aprovou sua inclusão no PAC. Mesmo assim, o Metrô não ficará pronto a tempo para a Copa, mas deverá ser um grande avanço para a cidade, na opinião da professora de urbanismo da PUC-RS, Ana Rosa Cé.

 

Ao comparar a qualidade do sistema de ônibus de Porto Alegre com o de outras capitais brasileiras, a professora o considera bom. “É, sem dúvida, melhor do que em muitas outras cidades, mas isso não significa que não deva melhorar”, complementa. 

Segundo ela, faltam mais linhas transversais que evitem ao usuário ter que passar pelo centro para ir de um bairro a outro. 

A sua expectativa é que os BRTs contribuam para resolver este problema, à medida que desafoguem a região central da cidade.

 

Na corrida contra o tempo, a prefeitura de Porto Alegre encaminhou, no final de agosto, três projetos da Matriz de Responsabilidades para a Copa à Caixa Econômica Federal, órgão financiador dos investimentos. 

 

O objetivo, de acordo com o secretário municipal de Gestão, Urbano Schmitt, é iniciar as licitações ainda em 2011 para manter os projetos no PAC da Mobilidade Urbana, já que as obras que não iniciarem até dezembro serão rebaixadas para o PAC “normal”.

 

Em agosto, o prefeito José Fortunati reuniu-se com a União das Associações de Moradores de Porto Alegre (UAMPA) para apresentar os projetos de mobilidade urbana à comunidade. Para o presidente da entidade, Sandro Chimendes, o encontro cumpriu seu papel. “Nosso objetivo de conhecer os projetos de transporte público foi alcançado. O prefeito falou bastante sobre o metrô e os BRTs”, conta.

 

Segundo Chimendes, os portoalegrenses costumam dividir-se em dois grupos quando o assunto são os ônibus da cidade. “Quem circula por áreas centrais geralmente não se queixa. Agora, os moradores dos bairros periféricos conhecem mais problemas, como a demora e a lotação dos ônibus”, comenta.

 

Mas uma reclamação é comum em todas as rodas de conversa da capital gaúcha: o preço da passagem. Reajustado no último verão em R$ 0,25, o bilhete custa hoje R$ 2,70. Para a professora da PUC/RS, “o usuário só vai mudar de atitude se houver uma oferta qualificada do serviço público, com conforto, conveniência e economia. Depois, podem vir as campanhas para sensibilizar os cidadãos”, diz. 

 

Estacionamento x pedestres


Ana lembra que um dos principais problemas para quem dirige nas áreas centrais de Porto Alegre é a busca por vaga, que se tornou praticamente uma caça ao tesouro. Por isso, diz ela, os estacionamentos se tornaram grandes negócios, com risco praticamente zero, lucro imediato, manutenção baixa. 

“A cidade está cheia de terrenos vazios nos quais os proprietários não querem investir; simplesmente derrubam as construções e abrem espaço para carros”, observa. 

Para ela, trata-se de mais um obstáculo no caminho do pedestre. “Mesmo com sinalização adequada, essas garagens incomodam quem transita pela calçada”, conclui.

 

Para resolver outra dor de cabeça dos motoristas – o congestionamento — os projetos da Copa contemplam dois viadutos na Terceira Perimetral, via concebida para ser expressa, mas, que ao contrário, é um dos grandes gargalos da cidade. “A Terceira Perimetral tem problemas em quase todos seus cruzamentos. A articulação com suas radiais ainda deve ser melhorada”, opina a especialista. Os projetos dos viadutos, mais três passagens de nível, também foram entregues à Caixa no final de agosto.

 

Aeromóvel e catamarã


Se a Matriz de Responsabilidade da Copa privilegia obras viárias, outras iniciativas fora do pacote, como o metrô, beneficiam o transporte de uso coletivo e alternativas ecologicamente sustentáveis. Dois projetos que devem sair do papel ainda este ano são o aeromóvel e o catamarã.

 

As obras do Aeromóvel, que vai ligar a Estação Aeroporto da Trensurb ao terminal 1 do Aeroporto Internacional Salgado Filho,  estão cerca de 50% concluídas. 

Comemorado pela prefeitura, o novo transporte é ambientalmente sustentável e deve fazer o trajeto de um quilômetro em 90 segundos. Os dois veículos, com 150 e 300 lugares, serão dotados de ar-condicionado, acessibilidade universal, espaço para bagagens e portas automatizadas. 

 

A previsão é de que no início de 2012 já sejam feitos os primeiros testes de operação.

O sistema de transporte foi desenvolvido nos anos 1970 pelo gaúcho Oskar Coester e se baseia na propulsão automatizada por meios pneumáticos. Uma linha experimental chegou a ser construída em Porto Alegre, mas a operação comercial somente foi consolidada em 1986, em Jacarta, na Indonésia.

 

A outra novidade será por via fluvial. Com lançamento do serviço estimado para outubro, o catamarã tem capacidade para 120 passageiros e deverá fazer 28 viagens diárias entre Porto Alegre e Guaíba. 

O veículo da empresa Catsul realizará o trajeto de 15 km em cerca de 20 minutos e é uma aposta ecologicamente sustentável para ajudar a desafogar o vai e vem de moradores entre a capital e parte da Região Metropolitana.

 

Ciclovias


Para estimular o uso de bicicletas na cidade, a prefeitura promete quadruplicar nos próximos anos a extensão de ciclovias. Parece muito, mas Porto Alegre tem apenas 3,2 km de vias para bicicletas e são dois trechos que não se comunicam e acabam sendo utilizados basicamente para o lazer. 

Outros 4,6 km estão sendo concluídos no bairro periférico da Restinga. “Felizmente o tema está na pauta da prefeitura. Mas é preciso avançar e mudar a mentalidade das autoridades e da população de que a bicicleta é uma alternativa de transporte para o dia-a-dia, não só lazer”, ressalta Ana Rosa Cé, da PUC-RS.

 

Quatro projetos do PAC da Copa contemplarão ciclovias em suas obras, totalizando 13,5 km. Com recursos próprios e contrapartida da iniciativa privada, a prefeitura pretende entregar à população mais 17,4 km de ciclovias até o final de 2013. Segundo o diretor-presidente da Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC), Vanderlei Cappellari, a primeira obra a sair do papel deve ser a da avenida Ipiranga, prevista para iniciar ainda em setembro.

 

Calçadas e acessibilidade


A prefeitura de Porto Alegre deve lançar em breve uma campanha para a preservação de suas calçadas. Segundo o secretário municipal de Acessibilidade e Inclusão Social, Paulo Brum, 90% delas são de responsabilidade do proprietário do terreno. Com o novo projeto Calçada Segura, o objetivo é sensibilizar o comércio e os moradores para que cuidem de suas calçadas e padronizem os pisos. O secretário afirma que, se o descumprimento da lei persistir, a prefeitura irá aplicar multas e poderá até cassar alvarás de funcionamento de estabelecimentos comerciais. “Não queremos chegar a extremos, por isso, apostamos na mobilização da comunidade”, diz Brum. 

 

A Secretaria Especial de Acessibilidade e Inclusão Social (SEACIS) comemora o recente lançamento do Plano Diretor de Acessibilidade, pioneiro no país. 

 

Com 43% dos ônibus da cidade adaptados para cadeirantes e a exigência de que todo novo veículo atenda a esta demanda, Porto Alegre quer se tornar referência.

 

"Em 2014, a cidade terá acessibilidade total", afirma o secretário.

 

Riscos sobre duas rodas


Quem se aventura a andar sobre duas rodas diariamente precisa redobrar a atenção. Renata Signoretti adotou a bicicleta para ir ao trabalho e à universidade há quatro anos. Nunca sofreu um acidente, mas foi testemunha de um caso emblemático que recentemente colocou Porto Alegre no noticiário nacional e internacional.

 

No dia 25 de fevereiro deste ano, o motorista Ricardo José Neif, com seu Golf preto, atropelou dezenas de ciclistas do movimento Massa Crítica que pedalavam no bairro Cidade Baixa em um de seus passeios mensais pela defesa do transporte alternativo. Renata estava lá e viu seu namorado ser levado para o hospital inconsciente, apesar de ter sofrido apenas escoriações. O susto deixou a estudante de 25 anos receosa em pedalar nas pistas e trocou-as pelas calçadas.

 

“Parecia que a qualquer momento poderia acontecer de novo, foi inacreditável”, relembra. Aos poucos, voltou a dividir as faixas com os automóveis. Para ela, o mais difícil é fazer com que os motoristas compreendam que lugar de bicicleta também é na rua. Há três meses sem poder pedalar devido a uma cirurgia em um dos joelhos, Renata voltou a utilizar o ônibus como meio de locomoção.

 

“Eu não tenho do que reclamar. As linhas costumam respeitar os horários”, diz. Com os pés agora no chão, a universitária diz ter percebido mais respeito ao pedestre e até mesmo aos ciclistas. “Na hora de atravessar, há mais carros parando para o pedestre. Ainda não é todo mundo que respeita a faixa, mas minha impressão é de que estamos evoluindo”, conclui.


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